quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Bom dia







“Bom dia”, diz ela. Me fita com aqueles olhos dissimulados. Ainda ontem me evitava e hoje está aqui despida de arrependimentos entre os meus lençóis e sem nenhuma promessa.

       Até parece que não sei a enrascada que ela é, mas ainda não aprendi negar ao seu pecado doce. Não sei e bem no fundo não quero.

Ceder aos seus caprichos virou minha mania necessária que funciona conforme ela quer. Assinei meu status de disponibilidade que tem hora e dia para começar, no entanto nunca se finda... Essa danada me manda e desmanda sem pedir licença.

       Ainda são quatro da manhã quando o meu telefone toca e antes mesmo de olhar a tela, já sei quem é. Mais parece um sonho que aos poucos muda de cor e aos poucos se torna um daqueles pesadelos de perseguição que insiste em nos assombrar. 

      “Alô”. Do outro lado da linha nenhuma pergunta e muito menos satisfações.

 Ela mia, geme e faz promessas. E, eu? Ah. Eu acredito. Não pergunto de onde vem ou quem quem vai. Apenas devoto saudades e busco aquelas fantasias que mais se parecem migalhas jogadas pelo chão da casa que trilham um caminho de pecados onde preciso for. 

Meu ponto fraco é aquele pedaço de mulher e ela sabe me controla. Assim, voltamos mais uma vez para os meus lençóis, nosso gozo, suor e desejos compartilhados...

Nossa paixão é pragmática. Depois de uma noite louca, ela se veste olhando pra mim, toma café, me beija demoradamente me deixando um gosto de pasta dental e vai embora. Fácil e descomplicado assim. Sua tortura é lenta, mas certeira.

     Minha vontade é pedir para que ela fique. Mas como bem sei em outra madrugada ela volta. Ela sempre volta. E nesse dia quem sabe ela não queria mais me deixar.


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domingo, 11 de janeiro de 2015

Meu bem

 



     Você sempre foi a minha incógnita mais bonita, meu bem. Minha interrogação que muda de perspectiva todos os dias.
     Algumas vezes te odeio. Outros nem tanto. Em alguns dias te amo. Noutros nem sei o que sinto.
     Estranhamente você é aquele misto de amor louco. Amor que eu sempre quis e que ao mesmo tempo jamais queria sentir.
     Te odeio por me fazer esperar chamadas perdidas que não existem, na esperança de te retornar e ouvir sua voz de quem tentou antes de mim. Te amo por me acordar com o "bom dia" mais sincero e me abraçar apertado enquanto adormecemos de novo.
    Te amo por me fazer sentir uma parte necessária do seu mundo. Te odeio por me deixar sozinha nessa confusão que é a sua vida, sem saber em que parte disso tudo me encaixo.
     Inconscientemente você alimenta meu ódio com seu jeito descomplicado. Esse jeito estranho de quem dá de ombros para tudo, como se não estivesse nem ai para nada.
     Mas ainda assim fico. Acho que gosto desse seu sorriso de quem mente sem esforço algum, da sua barba mal feita de menino desleixado e preguiçoso. Da sua mão na minha pele arisca. Do jeito que me aninha nos braços para desfazer a minha cara amarrada e do seu jeito de bom moço que fala sobre um futuro bom que eu sei bem que não existe. Só que ao mesmo tempo não suporto nada disso. Você entende?
     Me acostumei a te amar e é disso que tenho medo.
    Seus erros são perdoados e minha fé em você restaurada sempre que me beija e diz que vai ficar tudo bem. Sei que não vai, mas para me agarrar nesse fiozinho de esperança, acredito!
    Sempre te disse que a paixão é burra e o amor é cego.
    Meu bem, você sempre é a minha incógnita mais bonita, mas até quando?

sábado, 22 de novembro de 2014

Carta




Olá querido,  

     Começo essa carta afirmando que sou covarde. Mas, não se preocupe, isso não é exatamente um problema. É algo que talvez devêssemos conversar, já que essas palavras não ousam sair da minha boca quando te vejo.
    Escrevo para te contar que ando cultivando um buraco negro no peito. Uma escuridão imensa que suga um pouquinho da minha felicidade todos os dias. Mas parece que você ainda não aprendeu a leitura corporal da minha tristeza, muito menos sabe observar esse meu jardim escuro. Então apenas insisti em deixar pra lá enquanto me pergunta apenas o trivial.
     Sorrio com vontade de chorrar. Na verdade meus dias não são interessantes. São cheios de óbvios e gestões de crises possíveis. E sabe o que mais? Entre todas as "coisas" previsíveis na minha vida está você...
    Você que me prometia o céu e a terra. E que na maioria das vezes cumpria os excessos. Até parece que a nossa promiscuidade virou uma partida de dama regada a chá e biscoitos.
     Escrevo na tentativa de nos tirar dessa calmaria, ou para nos mergulhar nela de vez. Escrevo para não te perder ente nossas caixas, retratos e desinteresses. Escrevo para que você me leia nas entre linhas, antes que outro livro te pareça mais interessante que a nossa própria história.
    Só não venha disser que você também não consegue ver...
    Amor não é esse jogo de cordialidades meu caro. Amor que é amor há de ser louco, intenso, cheio de sorrisos e doces ou nem que seja azedos, mas pelo menos é...
     Pois não sei se isso você também não sabe, mas amor morno é placebo.

segunda-feira, 10 de março de 2014

Falar de amor ou pedir perdão?



      Enquanto o desassossego parecia ignorar a importância do silêncio noturno daquele bairro pacato eu me perdia dentro de um solitário quarto azul, entre inúmeros pensamentos e as várias línguas afiadas da minha cabeça . 
     Naquela noite longa uma prosa incansável entre a razão e a emoção batia sempre na mesma tecla e eu apenas fingia desconhecer os assuntos daquele julgamento interno.
     Fechei os olhos no meio de um discurso de que 'você podia ter feito assim ou assado' e mergulhei involuntariamente nas boas lembrança que ainda me restavam. 
     Por alguns instantes pude sentir o perfume adocicado dos seus cachos. Cachos que me faziam cocegas em meio aquele vai e vem do seu corpo nu. Vi por um momento seus olhos brilhantes pulsando, enquanto me contava cada detalhe do seu dia. 
     Lembrei dos seus sorrisos nervosos fora de hora que me diziam frases inteiras sem eu ter perguntado nada.
     De memória em memória fui sentindo uma fome de você em forma de saudade... 
     O relógio parecia incontrolável e cada tic-tac me lembrava que o tempo não cicatriza a dor de quem não aprendeu amar quando teve sua chance.
     Peguei o telefone. Os números saíram dos meus dedos vagarosamente como o segredo de um cofre valioso.
     O telefone chama - uma pontada no estômago -. Chama - um suor escorria pelo rosto -.      Chama - um coração em desassossego -. Chama e do outro lado da linha alguém diz "Alô". 
     Do lado de cá olhos esbugalhados e mais nada. Um cão ou um rato? 
Silêncio.
    Bati o telefone com a força de quem nocauteia o seu adversário. Um rato!
    Paralisei sentindo o peso do mundo nos ombros em meio a fumaça dos meus cigarros que dançavam um triste tango sem nome.
    Mais uma tentativa. Mais uma chance desperdiçada. E mesmo com tantas frases ensaiadas diante do espelho nada saiu pela minha boca. 
    Respirei fundo e mais uma vez viajei naquele teto azul e no relógio com seu eterno tic-tac que me cobrava a pressa que eu não sabia.